Library's James

nebulosa manhã se iniciava em pinceladas singelas de um céu aclarado pelos feixes da maior das estrelas. O relógio de cabeceira indicava o menor dos ponteiros no 6. Raleigh teimou em escancarar seus olhos tempestuosos e gélidos. A rotina era maçante e nada, nada animadora. Entretanto, aquela manhã seria diferente, devido ao fato de que os pequenos rascunhos de bruxos, realizariam as compras na Fenda - evidentemente, sob a supervisão de alguns funcionários da MACUSA, além daqueles do lar institucional de crianças e adolescentes. Relembrar esse verdadeiro acontecimento, foi o suficiente para que o garoto de cabelos desgrenhados e volumosos, saísse correndo na frente de meia dúzia, a fim de poder utilizar o toalete a firmar-se pronto para a saída. Suas pernas eram ágeis e sua estatura elevada para a idade, ajudava que tivesse uma vantagem sobre os demais. Pôs-se sobre o batente da porta, não conseguira ser o primeiro, mas, seria o próximo da fila. Escorando-se na madeira à frente, Raleigh recebeu os empurrões dos que chegavam, ao tempo de forçar seu corpo para trás - ou do contrário, seria amassado - em meio a desgostosas revirada de olhos. O trinco da porta já poderia ser audível quando, sem mais nem menos, o pré-adolescente sentiu um puxão assaz violento, seguido de algo que se colocava à frente dos calcanhares, restando, de nádegas no canto mais próximo. - Aaaai! - Exclamou, de olhos cerrados em vista da dor que se fez na região. - Isso não vale, seu... - Palavreou, em vão, pois aquele típico folgadinho que fazia de tudo para chamar atenção, adentrou ao banheiro acompanhado das gargalhadas de seus comparsas. Raleigh se ergueu - com dificuldade e sem ajuda, vale mencionar - e se encaminhou para próximo da porta, quando o restante do grupo o empurrou (só que dessa vez ele estava mais atento e não restou ao chão). Olhou-os emburrado e logo fez menção de seguir para trás destes, mas mesmo aquele outro garoto que vivia escorado pelos cantos, não deixou que Raleigh tomasse a frente, sendo que ele, antes, estava na frente de todos eles. E depois o outro e mais o outro que vinha logo atrás. - Tsc, idiotas... - Murmurou, mais a si mesmo, seguindo para o final da fila, enquanto colocava a toalha gasta por cima de um dos ombros.

O trajeto até a realização das necessidades da natureza pareceu uma eternidade, mas ele finalmente conseguiu tratar da higiene primordial como um relâmpago. - 13... tá faltando um, ah, olhe ele ali, Raleigh! - Anunciou, o timbre respeitoso da srta. Hoffman, uma das educadoras. O garoto correu aos tropeços ao pequeno aglomerado, no mesmo instante em que enfiava de qualquer jeito os cadarços de seu all star para dentro do próprio pé. - Os funcionários do Congresso Mágico já chegaram, Raleigh, se você não tivesse demorado tanto em seu banho, teria conseguido tomar café. - Explanou, com ar de reprovação. Contudo, nem isso foi o suficiente para que o garoto se sentisse desmotivado ou retrucasse - como faria de costume. Raleigh se limitou a - tentar - se misturar ao grupo, passando a ouvir as orientações gerais passadas pelos engravatados. Basicamente, eles seriam transportados por meio de pequenas chaves de portal em formato de livros, caldeirões de estanho e objetos correlatos ao mundo bruxo. - E não se esqueçam de pegarem antes o saquinho de moedas. Há quantidade o suficiente para que possam comprar tudo que precisam da lista de materiais. - Orientou, a responsável em tom mais cordial. Raleigh posicionou-se na extremidade da mesa recém conjurada, frente a um lembrol, tendo logo pego o saquinho e o atirando para dentro do bolso da jeans. Com um olhar de relance, pôde perceber a aproximação do rapaz que o havia empurrado na fila e, segundo considerava, esse teria de pegar a pena, pois os demais lugares na grande mesa, já estavam ocupados. Tão velozmente quanto veio aquele pensamento errante, Raleigh tratou de recolher a mão que fazia menção de surrupiar o saco de moedas do do outro. Uma nova olhada por cima dos ombros, ele não parecia muito atento ao lugar que teria de ocupar. Mas a hesitação veio e já era tarde para ele devolver a agressão sofrida, surrupiando as moedas do outro, visto que o tal acabava por perceber o lugar vago ao lado de Raleigh.

- Tudo certo, meninos? Bem, agora que já pegaram as moedas, podem tocar a superfície do objeto que está à frente de cada qual. - Falou a mulher. Raleigh pôde perceber que os funcionários da MACUSA já não mais estavam entre eles, muito provavelmente estivessem na Fenda, tendo aparatado, julgou. Um a um, os garotos iam sendo engolidos no vórtex, Raleigh com as mãos trêmulas e ávidas para tocar sua chave de portal. Percebeu que o folgado ao seu lado parecia muito nervoso, de modo que não parecia ter coragem para o ato. - Não vai se borrar todo, hein, Montgomery. Panaca. - Disse, com um sorriso de escárnio nos lábios. Após, tateou a superfície do lembrol, sendo sugado por meio da magia contida no mesmo.

Raleigh, agora, encontrava-se sobre os dois pés, quase tendo tropeçado no calçamento de pedregulhos irregulares. A atmosfera era serena e a visão que passava a ter do local, era saudosa e alegre. Não era sua primeira vez à Fenda, e o sentimento era difícil de se descrever, pois por um lado ele se sentia contente de saber que estava cada vez mais próximo de dar adeus àquele lugar tão competitivo e solitário; do outro, ele remontava as tantas vezes em que acompanhara sua mãe na compra de ingredientes de poções ou o seu pai, que fazia questão de preencher sua ausência o entupindo de guloseimas.

- Vocês terão duas horas para comprar todos os itens do material, meninos. Há funcionários da MACUSA por toda a extensão da Fenda, portanto vocês estão seguros e, mais do que isso, se vocês aprontarem, vão ter que se ver com eles, submetendo-se ao rigor da lei. - Ponderou, em tom intimidador. - Podem ir. - Raleigh só esperou as orientações gerais e seguiu na direção oposta aos dos outros. Seria bom evitar problemas e, além do mais, ele não tinha amigos por ali. Achou por bem as funcionárias da instituição, além dos representantes das lei terem os deixados "livres", afinal, eles eram órfãos e já estavam mais do que acostumados a terem que cuidar de si mesmos. Dali para frente, talvez não fosse ser muito diferente.

Na entrada da livraria, o garoto admirou o mostruário, enquanto fitava parte do anúncio que convidava para uma sessão de autógrafos de um novo best-seller bruxo o: As mil faces, o relato fiel da vida de um metamorfo, de Anthony Hume. Raleigh adentrou o estabelecimento que fervia de crianças que, assim como ele, buscavam riscar da lista de compras os instrumentos tão necessários ao enriquecimento intelectual. A maioria (apenas para não dizer todos, pois ele se encontrava entre eles) acompanhada de seus pais ou responsáveis. Inúmeros títulos se alongavam no topo de prateleiras circundantes, cujos encartes, flutuavam ora ou outra por meio dos meios mágicos empregados pelos atarefados funcionários. Correu os olhos da lista, ao aglomerado central da livraria. Sabiamente eles já haviam separado vários kits do primeiro ano em pilhas ornadas em formato espiral. Na ponta dos pés, por cima de um ombro ou outro, ele conseguiu visualizar o preço, olhos arregalados. Ia muito além de seu saldo, e a essa altura ele se arrependia por não ter furtado o saquinho de moedas do outro garoto tão abominável. Vagou do tumultuado espaço às longas fileiras de estantes, o jeito era procurar pelos de segunda mão. Seus dedos longos e ossudos, percorriam as lombadas do livros, de uma extensão a outra. Seus olhos resplandeciam entre uma folheada ou outra. Raleigh poderia ficar por horas e horas e ainda sim, não se cansaria.

- Letra A... Animais fantásticos, aqui. - Comentou, a si mesmo, tangenciando de uma longa fileira para uma nova. - Manual básico de transfiguração, certo... vamos ver, tô mais perto do Q. - Seguiu, desviando de algum outro adolescente mais velho ou outro, enquanto atentava-se à lista e aos preços. Nessa parte da loja, era como se todo o furor da fachada da loja tivesse a milhas de distância. As fileiras de estantes que perdiam-se de vista, abriam margem para um outro mundo; um mundo idílico, inexplorável e instigante.


Quando menos percebeu, uma hora e meia já havia se passado desde que ele se pusera a ler aquele exemplar do anúncio que se encontrava largado por sobre um dos enfileirados títulos. - Ai não! - Exclamou, tratando de pegar o restante dos livros que estavam empilhados ao seu lado e praticamente se atirando em direção da fila do caixa. Raleigh correu, com a mesma agilidade que outrora. Um aglomerado de garotas acabava por finalizar suas compras, rumando em direção da fila que se encontrava livre. Usou dos ombros para, deseducadamente, empurrar a que se aproximava. - Aqui, toma. - Falou, no mesmo tempo em que oferecia o material e quantia que ele já havia calculado mentalmente umas três vezes. O atendente o fitou com certa reprovação por sua total falta de cavalheirismo, mas seguiu com as compras. - Obrigado, obrigado. - Falou, de rosto corado às meninas que faziam piadinha as suas costas, por conta do ocorrido. Após, o futuro bruxo se lançou na maçaneta, arrastando a sacola nos calcanhares. Parvo, ele deixou o local.

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